O enredo abrange décadas e começa desde o nascimento de Jun, atravessando sua infância, adolescência e vida adulta. A obra nos conduz por uma jornada profundamente humana, marcada por desafios diários enfrentados não apenas por Jun, mas por toda a sua família. A autora retrata com grande delicadeza o impacto do autismo na dinâmica familiar, em especial, o sentimento de solidão e invisibilidade da irmã, que muitas vezes se vê relegada a segundo plano diante da atenção total dedicada a Jun pelos pais.
A história denuncia as inúmeras barreiras que a sociedade impõe às pessoas autistas: o preconceito, a falta de empatia, a ausência de políticas públicas, e uma estrutura social despreparada para acolher a neurodiversidade. No entanto, o que pulsa com força em cada página é o amor incondicional dessa família, sua dedicação incansável e o desejo genuíno de proporcionar a Jun não apenas cuidados, mas uma vida digna, plena e feliz.
Para leitores que não convivem com alguém dentro do espectro, JUN oferece uma oportunidade rara de empatia e compreensão: um mergulho cuidadoso no funcionamento da mente autista, seus padrões de comportamento e suas formas únicas de interação com o mundo. Já para quem vive essa realidade no dia a dia, a leitura pode ser profundamente emocionante, capaz de confortar, inspirar e oferecer esperança, ao mostrar que, apesar das dificuldades, o afeto, a paciência e o apoio familiar são forças transformadoras.
Destaco especialmente a mãe de Jun. É emocionante ver sua insistência, resiliência e obstinação pelo bem do filho. Como ela se molda para se dedicar quase integralmente ao filho e os resultados de tudo que ela luta finalmente aparecerem.
A edição da Pipoca e Nanquim é um capricho e se destaca nos pequenos detalhes. Como as páginas de guarda azuis, cor símbolo da conscientização sobre o autismo. A arte de Gendry-Kim, ao mesmo tempo simples e expressiva, dialoga com o conteúdo potencializando a carga emocional do relato.
Um ponto de atenção é que os dois textos introdutórios da edição, apesar de bem escritos, revelam um pouco sobre o desenvolvimento da trama, o que pode diminuir o impacto de certas descobertas narrativas, especialmente o momento-chave em que Jun finalmente consegue atravessar, simbolicamente, a “porta” que o separa do mundo exterior. Metáfora usada com sensibilidade pela autora.
Através do piano e do pansori, (um gênero musical tradicional coreano onde um único artista interpreta uma história, combinando canto, narração e expressão corporal), Jun passou a compor suas próprias peças e se apresentar. Seu talento o fez ser visto não mais como um garoto autista, mas como um músico.
Ele começou a falar repetindo as letras dos cantos e costumava fazer apresentações curtas todos os domingos em Insa-dong, bairro turístico tradicional da capital Seul. O menino, que parecia tão desajeitado em tantas outras atividades passou a florescer e com isso a vida da família passou a ser mais tranquila, mas sem deixar de se preocuparem com sua autonomia.
JUN não é apenas uma obra sobre o autismo. É uma obra sobre a condição humana, sobre vínculos, sobre os limites e a força do amor. Um quadrinho que merece ser lido, relido, presenteado e compartilhado.
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O encontro entre Gendry-Kim e Jun aconteceu no outono de 2010 em uma aula de pansori. Foi deste contato que surgiu a vontade de criar esta história em quadrinhos. Foto: Pipoca e Nanquim |
Matéria feita pela Estação de Rádio sul-coreana Gugak FM sobre Jun e sua família:
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